sábado, 19 de novembro de 2016

No teu corpo


O meu corpo,
contigo,
é mais corpo.

Os ossos tornam-se mais maleáveis,
os poros abrem-se,
as mãos atrevem-se. Dirigidas.
A boca explora,
pêlos são sorvidos, como em carícia;
pélvis ajeita-se em cadência de acordes não acordados,
em compasso, compensado.
Os olhos cerram-se,
enquanto cabelos voaçam, percorrendo corpo.
As pernas estão mais tensas, estreitam-se;
uns dedos mais esticados para a nós chegar;
outros dedos mais suaves, mesmo que em urgência de toque. Espraiam-se. Encorporam-se.
Os braços descobrem vigor só por te embraçar.
Descubro mais músculos, mais movimentos, mais força.
As coxas, urge-se!, procuram, compelem-se a ser mais palpáveis,
ora se apartam para te deixar entrar; ora se unem para não te deixar sair.
Ora se vêm;
ora se vêm.
Ora se baralham e não sabem, já, onde reside entrar e sair.
Estômago desenvolve ritmos de trabalhador,
coração discorre-se em cem metros de barreiras não esperadas,
pulmões estão mais inspirados
(sopra, inspira, sopra, expira, sopra, respira),
é nosso - o peito em seus descontidos sons des-uníssonos.
A fantasia abre-se,
tão aberta, arrojada, envolvente. Dissolvente.
Língua mais absorvente,
garganta mais profunda,
pele mais sensível
 - tão, tão sensível; estimulada, abraçada, sentida, percorrida; ah como ela se torna tão percorrida..., como se fora querida.
...

No teu corpo, eu deixo de ser o meu para ser o meu em teu.

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Frases 5


(I got used to "in and out" beings; more than parachutes; io-iôs!; (...) One often gets to be what one gets),

escrevo há dias e releio entretanto e fico pensando em todos os io-iôs que já viveram a minha vida, que não se deixaram ser apenas
in
out,
e foram
in
out
in
out
in
out
in
out.
Out.
Out.
E eu permitindo e indo. E vindo.
e indo
e vindo
e indo
e vindo
e indo
e indo
e indo.


Io-iô.

Um acto, de facto


Eu conheço um acto,
de facto,
que, quando do suor
– mesmo daquele que não escorre; o que, assim que se cria, logo se evapora, de tanta velocidade –
nascido,
(e dado)
consegue transformar-se em qualquer outro acto
assim o tenhamos vivido.
Experiência própria e barriga cheia.
Fado empírico.
Desde há muitos idos anos,
intermitentemente:
ora agora mando eu, ora agora mandas tu;
que engraçado! Enviámos ao mesmo tempo!
Ora agora já não mando, ora agora já não recebo;
ora agora até já
que a hora agora é de pausar.
Hummmm… está bem. Só mais umas poucochinhas. Em breves linhas.

……………………………………….

Desde talvez demasiado tenra idade que as troco. Naturalmente que lê-las também é uma forma de trocar. E, pensando bem, escrevê-las terá de o ser também. E com estes dois actos, não haja grandes dúvidas, conseguimos suar já bastante.

Só que hoje (foi hoje; amanhã já poderei discordar) dei por mim empiricamente pensando que trocando-as, parece que as vivo - em riso, em prazer, em tristeza, em gozo, em brincadeira, em sofrimento, em desafio, em dor, em felicidade, em desespero, em tanto, em tudo - também.

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

É só uma fase, Rita


Muito do que nos constitui são as nossas mais que diversas características. Algumas delas são mais preponderantes, comummente designadas por “aquilo que nos faz sermos quem somos”.

Agora, imaginem que, por alguma razão não traumática, de forma, até, consciente, passamos uma fase (dá-me jeito chamar-lhe uma “fase” para me sentir melhor comigo mesma; permitam-mo!) em que resolvemos alterar de forma drástica alguma determinada característica daquelas que nos fazem sermos quem somos.

De uma forma directa, exactamente porque estou a ser demasiado explícita em relação ao tema e achar que estas reflexões ficam melhor entregues em entrelinhas e não oferecidas em badeja, não vou aqui descrever ou sequer mencionar a que me refiro.


Eu hoje só queria colocar uma questão: acham que considere provisoriamente mudar de nome?

domingo, 13 de novembro de 2016

4 ou 5 linhas de horas e suor


É difícil olhar para algo tão pequenino e perceber que por detrás estão tantas horas e tanto suor.

É difícil, quando acompanhamos, mesmo ali ao lado, pegando a mão e gritando em desuníssono na tentativa de dar “Força! Já estou quase a vê-lo!”


Torna-se impossível quando tantas horas e tanto suor estão por detrás de mãos que não dão sequer para pegar, porque têm dedos hiperactivos que percorrem teclas, cordas, barro, pedra, rato, caneta, um sem fim de meios, para chegar a, por exemplo (e isto é só um exemplo), 4 ou 5 linhas.

Leve, levemente


Estava eu muito bem passeando pela brisa de uma tarde (eu não faço a mais pequena ideia se foi uma tarde, uma manhã ou uma noite, mas, quando jogamos com palavras, mesmo que roubadas, damos por nós transformados em seres atrevidos), quando começaram a chover potes de palavras com expressão diferente, cortantes como canivetes, determinadas a molhar-me que nem tolas, em pingos moles, dos que furam.

Porventura, eu já chegara àquela tarde molhada e seria como chuva em vão.

Mas não. Era chuva abençoada. Roubando, abensonhada.

“Poesia!”, espirrei!



E fui molhar-me, não fosse apanhar uma valente constipação.

sábado, 12 de novembro de 2016

O direito do 9 de nevembro de 2016


Uma foto de avental com balde consegue chegar às 92 reacções (agora temos de chamar-lhes reacções; os gostos já podem ser substituídos por adoros, risos, surpresas, tristezas e iras), sendo que estas reacções incluem gostos e adoro, já para não contar com mais 8 comentários escritos, para além de outros, falados.
É uma bonita fotografia, sim. Registada com amor, também.

Ira, senti. Com alguma, já pouca e desse dia em diante quase nula, surpresa.
Não pelas 92 mais 8 mais qualquer palavrinha.
Mas pelas, em média, 8 reacções sacadas no 9 de Novembro de 2016. Não vale contar repetidos, pelo que me reduzo à média. Mas não. Atrevo-me a fazer um somatório. Três pensamentos de Rita Fonseca geraram 28 reacções, 7 comentários escritos e… bom, aqui, para ser sincera, confesso que passei o dia zangada, indisposta, enjoada e não era possível sequer chegar à minha beira para dizer fosse o que fosse sem que eu gritasse alto, pelo que os comentários falados foram praticamente inexistentes (o praticamente deveu-se a carinho sentido por uns; pontual; e uns repetidos, também).

Gostava de poder acreditar que é porque o amor consegue mais reacções que a ira ou a surpresa.
Gostava de poder acreditar que seria por ser dia quente (mais que o outro, apesar de o outro ter sido em véspera de último dia do mês de Julho e até estar de manga cava na varanda enquanto que neste dia 9 de Novembro de 2016, não chovia, estava ameno, mas às 6 e meia da manhã, na varanda, envergava pijama quentinho e uma manta sobre as pernas) e com quilos de informação a saltar a cada instante o que tornava difícil reagir a todas.
Gostava de poder acreditar que seria porque (está provado, mais que provado, por todos os estudiosos de redes sociais, publicidade e afins – não me lembro de alguma vez ter sido testada para tal) uma imagem é sempre mais apelativa que qualquer texto, mesmo que curto, apenas com 3 palavrinhas.

Mas não acredito, sabes, Sacal.
Deixei de acreditar exactamente porque aquele 9 de Novembro de 2016 tinha acontecido já.
Foi o dia de todos os enganos. De todas as traições.
Não lamento, Sacal. Não consigo lamentar o que senti, reagi e despejei nesse dia. Não consigo lamentar sentir-me enganada e ter ficado pé atrás desde esse dia. Acho que tenho direito a tal. Afinal, como tu bem sabes, eu sempre acreditei muito. Acreditava sempre e depois desiludia-me e depois acreditava e depois sentia-me estúpida e depois acreditava e só quando dava uma violentíssima queda, começava a sentir.me enganada. Pelo que tenho o direito de, por uma vez, logo à primeira, deixar de acreditar.

Porque o 9 de Novembro de 2016 existiu. Tenho o direito.

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

São só anatomias, ok?



“Uma grande parte de mim é criança. Eu diria que para aí uma perna inteira, de virilha a tornozelo; pé, por alguma razão, sentindo-se excluído.”,
dei por mim pensando em tal, enquanto imaginava necessidade de me descrever perante pergunta que imaginei também.

Não saía disto. Questionava-me sobre “como descrever-me” e não saía da perna. Tentei passar para a direita, porque, de alguma forma, associei a perna esquerda à descrição de mim – coisa mais estranha, com franqueza; pensar em ter de me descrever e só me sair isto: perna esquerda feita criança; obriguei-me a olhar a outra e pensar “Se uma é criança, esta é o quê? Tem de ser outra coisa qualquer, bolas! Não me posso descrever apenas com uma perna!” -, mas minha cabeça não saía daquela. Eu bem que tentei forçá-la a interpretar outras partes do corpo, mais internas, mais sentidas, mais associadas ao descrever de nós próprios… Sem qualquer sucesso... Não havia maneira de a tipa (que é muito teimosa) se dirigir à interpretação do coração, dos olhos ou cérebro. De cada vez que a forçava, lá começava ela a mirar joelho, coxa ou tíbia esquerdos, feita íman, hipnotizada.

Eu também desisto. E como tendo a dar muita importância aos desvaneios da minha mente (isto só podia ser um devaneio…), propus-me tentar entendê-la:

“Criança, como? Infantil?”
Não, claro que não! Como raio pode mulher de já não tenra idade e com algumas responsabilidades, dar-se ao luxo de ter uma perna inteirinha de infantilidade? E logo tu…
(Este, “logo tu” deu-me alguma esperança de estar a falar com alguém que tinha conhecimento de causa…)

“Criança, como? Risonha e brincalhona?”
Disparate! Tu só sabes o que é ser risonha e brincalhona desde que te tornaste “crescida” e, maioritariamente, é-lo ironicamente, em defesa, e as crianças demoram anos até aprenderem a usar a ironia. Tantos, que deixam de ser crianças.

“Criança, como? Assimiladora?”
São grandes assimiladores. Mas é característica que se pode manter até sempre.

“Criança, como, cabeça? Diz-me lá. Sinto que esta tua teimosia tem algo por trás. E eu tenho coxas grossas. É muita criança que estás a por dentro de mim. Por que raio, ao tentares descrever-me, te vidras tanto em ser-me criança? O que faltou, para não conseguires matar esse tempo de mim ou, pelo menos, reduzi-lo a unha de dedo mindinho?”
Não sabes? Parece-me tão óbvio…
“Mas eu já sou tão crescida… Toda uma perna?...”

Imagina que tens necessidades. Básicas. Imagina que tens sede. Imagina que não há água que chegue a ti. Que acontecerá?
“Continuarei a ter sede. Poderei, até, morrer dela.”

Imagina que, depois de morta de sede, te oferecem um copo de água…
“Já estarei morta. Mas, como de sede, sorverei cada gota. Assimilando, rindo, brincando com elas; infantilmente, porque estarei crendo que não será copo, mas sim fonte.”
Que depois seca.
“Seca?”
Sim. Será copo. Não fonte.

“…”

“Não quero. Quero fonte de água.”
Não há.
“Não?”
Não houve. Lamento.
“Isso significa que terei sempre sede?”
Até que encontres oceano que te dê de beber.
“E que sede senti eu em criança?”
Ora!!! Mas era só o que mais faltava!!! Terei de dizer-te tudo, chiça?
(Digo… bolas!)
“Bolas! é para os putos…”
E não só…

Que sede sentiste, em criança?
“Tantas.”

Que sede sentiste tu, em criança?
“Tanta… Não havia rio que se lhe equiparasse…”

Que sede sentiste?
“És incisiva, tu!”

Muito. QUAL A TUA SEDE DE CRIANÇA?
"Não quero e não vou dizer. Também tenho o meu orgulho e pontos de timidez. Aceitas?"
Aceito. Em tamanho de perna com coxas grossas.


"Que alívio. Já me sentia entre espada e muro.
Já que aqui chegámos em conversa… dás-me uma festa? Pode ser na cabeça… ou pela perna esquerda. Acho até que, se te dirigires a pé, atingirás perna esquerda. Eu preciso. Dás?"
A meu jeito. Confluente. Ok?

Ok.