segunda-feira, 15 de maio de 2017

Sobre (algumas) dores


São as experiências da vida que nos vão ensinando o que dói.
Dar um chuto com o dedo mindinho do pé direito ao passar pela porta da varanda exactamente um dia após ter dado um chuto com o dedo mindinho do pé direito no móvel da entrada (a quem nunca aconteceu???), dói.
Dores de rins. Idealmente com febre alta que não se consegue baixar abaixo dos 38,5º (e essa, até é a temperatura em que nos sentimos bem) e que dura uns consecutivos, sei lá, 3, 4 dias, até que começa por fim a acalmar (em dia de aniversário de filho; até hoje acho que foi milagre dele, até porque era data limite de internamento). Ai dói, dói! Chiça!
Dores de rins. Mas não por infecção renal, mas sim porque, simplesmente, estamos com o período. E temos 12 anos, 13 anos, 14 anos, 15 anos, 16 anos (não vou aborrecer e saltarei umas décadas) e eis que lá se vão, ou, pelo menos, as que aparecem, já nem são dignas de frase. Como doíam…
Não conseguir abrir os olhos; sentir que toda a luz é um inimigo que ataca mesmo sem estratégia estudável e defensável; tic-tac de relógio passa a explosão seguida de explosão um segundo depois, que nos entra pelo pulso e salta rapidamente para a cabeça, onde se havia instalado a enxaqueca. A que dura horas a passar e às vezes até nem passa, transforma-se apenas em moínha por umas poucas de horas, mas nós sabemos que ela lá está. Dói e, pelo amor que me têm, por favor vão-se! Hei-de regressar.
DENTES! Não podiam aqui faltar os dentes, claro! Já foram até alvo de um texto por aqui. Não o dente, mas a sua alma. Quase me tornei crente! Pela dor!
Otites! Lembro-me de ver, tão claro como água, os dedos da minha mão escarafuncharem minha orelha, meu ouvido, tímpano dentro, quase até ao cérebro, e arrancar todas aquelas peças do meu corpo, mesmo que tal me desfigurasse, qual Van Gogh, para todo o sempre. Com a esperança (mais tarde pensada; nunca naqueles momentos) de haver ao menos alguém que o musicasse. Um hino à dor.
Ficar uns dias em que só conseguimos passar da cama para o sofá e do sofá para a cama, eventualmente fazendo desvio para a casa de banho, mas em modo 90º, porque já nem sabemos identificar com precisão onde nos dói, porque ele é a lombar, os dois joelhos, a cervical, o ombro direito, o tornozelo esquerdo, os pulsos e cotovelos (isto, atrevidamente, mais parece uma canção do Sérgio Godinho, mas não me apetece dizer “estou velho!”, ou, neste caso “estou velha!”, pelo que não me debruçarei por todas as “conclusões” do tema, que até é a parte da música de que mais gosto; pela velocidade, claro). “E onde dói, mesmo?” “Em todo o lado, Sr. Doutor…”
Uma canelada bem dada, também dói como o raio. Acredito que uma chapada também. Mas as que recordo, não foram em face.
Parir um filho de surpresa (possivelmente, sem surpresa poderia ter sido semelhante, mas dá um toque especial ao texto), em terra longe, sem epidural e este ter o cordão umbilical curto, dói para caraças (e, “caraças”, é porque hoje estou bem educada, como já deverão ter percebido).
Parir uma filha, sem surpresa, cesariana, mas com epidural a ser eficaz apenas num dos lados do corpo (neste caso, recordo bem, apenas do lado esquerdo – aliás, até ver a costura, fiquei sempre a achar que a minha filha tinha toda ela saído apenas do meu lado direito do corpo), não dói tanto como caraças, mas aproxima-se de outras máscaras. Ao menos, lembramo-las. E conseguimos encaixar o prazer no meio.
………………………………………………………………………………………………………………………………………………………
São exemplos de dores. Aquelas de que me lembrei esta noite de 15 de Maio, Primavera de 2017.
………………………………………………………………………………………………………………………………………………………
Na verdade, comecei por outras…
Mas o texto já vai dorido demais…


Sem comentários:

Enviar um comentário